Microcontos eclesiais
Em meus tempos de menino, na Franca do Imperador, a missa dominical era uma obrigação. Na igreja matriz, gente de todo o tipo exercia seu dever semanal de bom católico. As missas em latim, os cantos tradicionais e bem conhecidos, os grupos distintos de irmandades, cruzados, irmãos vicentinos, irmãos do santíssimo, ordem terceira, marianos, filhas de Maria e beatas de todos os tipos coloriam um culto que já se foi. Quem freqüenta hoje as pobres cerimônias embaladas por acordes desafinados de violão e melodias sem sabor não tem idéia do que era uma missa solene do catolicismo triunfante. Minha memória daqueles tempos sugere muitos personagens que se cruzam com seus dramas particulares na imensa matriz gótica da velha Franca dos anos cinqüenta. Veio-me uma primeira história. Depois, aos borbotões, muitas e muitas outras. Consegui colocar no papel as que seguem.
253. O mariano devoto desenha com a imaginação os seios firmes da filha de Maria que reza do outro lado da nave. (j. novelino)
254. A beata reza fervorosamente e vigia com atenção a mulher da vida que entrou no confessionário. (j. novelino)
255. O menino se engasga com a hóstia ao se lembrar de um pecado mortal não confessado. (j. novelino)
256. Inocentes cruzadinhas ou lolitas vestidas de branco? Essa é a dúvida do pároco de meia idade. (j. novelino)
257. Candidato a vereador, o sacristão pede esmolas e votos na hora do ofertório. (j. novelino)
258. Dois cães vadios são os únicos ouvintes atentos do pregador cansado e sem entusiasmo. (j. novelino)
259. O padre pediu outra galheta de vinho. Precisava de mais um trago naquela manhã. (j. novelino)
260. O decote da noiva era tão profundo que o celebrante se esqueceu de perguntar se alguém tinha algo contra aquela união. (j. novelino)
261. A eça negra entristecia a nave central da matriz, mas os filhos do morto sorriam sonhando com a herança. (j. novelino)
262. O padre tem pressa, mas as beatas cantam o Bendito com uma lentidão irritante. (j. novelino).
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